Perdendo a Noção

Hamlet 2
Andrew Fleming iniciou sua carreira como cineasta com o pé direito, gerando em 1994 o ótimo “Três Formas de Amar” (aquele longa onde Josh Charles gosta de Stephen Baldwin, que tem uma queda por Lara Flynn Boyle, que é apaixonada por… Josh Charles!). Seguiu firme realizando três anos depois o divertidíssimo e apavorante “Jovens Bruxas”. Mas alguns anos depois rodou a refilmagem de “Um Casamento de Alto Risco”, “Até que os Parentes nos Separem”, e desandou. “Perdendo a Noção” é um meio-termo em sua carreira: está longe de ter a energia dos seus primeiros trabalhos, mas não chega a ser uma comédia aborrecida.

Alternando alguns momentos inspirados com outros bem exagerados, Steve Coogan é Dana Marschz, um professor de teatro. Casado com Brie (Catherine Keener), ambos dividem o lugar onde vivem com Gary (David Arquette, que praticamente entra no filme mudo e sai dele calado), pois depois que Brie parou de vender maconha (!) o casal vive andando com os bolsos vazios. Dá que Dana tem um desafio para enfrentar no seu trabalho. É que a sua turma, formada somente por dois voluntários (Phoebe Strole e Skylar Astin), recebe inúmeros alunos que só estão ali por falta de outro programa cultural dentro do colégio onde estudam para passar o tempo. E lá vem algumas figuras bizarras, como a gangue de garotos liderados por um encrenqueiro (Joseph Julian Soria)  ou a menina extremamente tímida (Natalie Amenula). Só que as peças comandadas por Dana são fracassadas e sempre recebem desaprovação do crítico do jornal da escola, uma criança que não tem dez anos. E assim Dana passa dias e noites preso em seu seu quarto refletindo até que a inspiração chega. O resultado: uma sequência para Hamlet, de Shakespeare. Só que o seu roteiro é anormal, um musical sobre viagem no tempo que envolve até Jesus Cristo.

Dá que a narrativa inaugura uma tremenda polêmica, chamando atenção até mesmo da imprensa. Muitas ameaças também surgem, como a do diretor que vai acabar com as aulas de teatro se Dana não modificar o script. Mas tudo não passa de desvios para esperado ato final, onde é apresentada a aguardada peça teatral. E talvez por isso o filme passe a nos decepcionar tanto. Há um número musical muito divertido durante a apresentação, “Rock Me Sexy Jesus”, mas tudo é montado de forma meio atrapalhada e menos divertida do que se espera, fazendo com que as homenagens que o filme destina, ao teatro e a arte produzida com baixo custo e muita criatividade (não é a toa que “Perdendo a Noção” seja um filme independente), não ganhe muita força na prática, criando o típico caso de boa idéia no papel sendo executada com irregularidade na tela, valendo a ressalva tanto para o roteirista fictício de Dana e o real de Fleming. Mas o diretor é bem-sucedido ao menos em um quesito: a presença da doce e talentosa Elizabeth Shue. Ela, que é o melhor aspecto do filme, parece também receber um altar reservado por Fleming, vendo que aqui ela interpreta muito bem a si mesma.

Título Original: Hamlet 2
Ano de Produção: 2008
Direção: Andrew Fleming
Elenco: Steve Coogan, Catherine Keener, Joseph Julian Soria, Skylar Astin, Phoebe Strole, Melonie Diaz, Marshall Bell, Natalie Amenula, Amy Poehler e Elisabeth Shue.
Nota: 6.0

Morte Súbita

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 O australiano Greg McLean se tornou um diretor em evidência nesta década dentro do gênero terror assim como Alexandre Aja ou Marcus Nispel. O feito que alcançaram é admirável: realizar filmes de horror com baixo custo e com um invejável talento na construção de uma tensão insuportável e por vezes incrivelmente real. O filme de McLean que chamou a atenção e se tornou um bom sucesso de público é “Wolf Creek – Viagem ao Inferno”, seu longa de estréia cujo script se inspirava em um acontecimento real. A história sobre amigos em viagem que são vítimas de atos de extrema barbaridade não é uma novidade, ainda que a construção dos três personagens centrais desse filme se estabelecesse de forma original. Mas havia qualidades o suficiente nesta fita para deixar qualquer um extremamente tocado com a brutalidade e o realismo que tomam o decorrer da projeção.

Em “Morte Súbita” McLean adquire um resultado parecido. É claro que a história de turistas que se tornam presas fáceis de um crocodilo gigante não rende o mesmo peso que “Wolf Creek – Viagem ao Inferno”, mas o projeto tem, sem exageros, a mesma competência e seriedade de “Tubarão”, a obra máxima de filmes sobre os seres mais selvagens existentes na natureza e que se tornou tão banal com a vinda das sequências do próprio “Tubarão”.

A história é básica e eficiente. Michael Vartan, mas conhecido como o galã da comédia romântica “A Sogra”, é Pete McKell. A sua profissão se resume a fazer turismo e destacar a partir de suas observações bons locais para se hospedar, se divertir, comer um bom prato, etc. A sua missão é embarcar em um modesto cruzeiro que leva um pequeno grupo de pessoas, a maioria americanos, a contemplar os rios de um local inóspito da Austrália. Mas a guia Kate (Radha Mitchell, sempre excelente) tem que fazer um desvio no instante que vai retornar do passeio quando um possível sinal de emergência é acionado a alguns quilômetros dali. É daí que o perigo aumenta, pois a área onde eles ultrapassam é rodeada por um crocodilo enorme capaz até mesmo de prejudicar o barco onde estão excursionando.

A fotografia de Will Gibson é belíssima e ela é responsável pela eficiência dos momentos de horror, onde a escuridão predomina quando os ataques do crocodilo começam. E pelo orçamento razoável que McLean tinha em mãos (20 Milhões) é preciso certa compreensão do espectador enquanto aos efeitos especiais que moldam a aterrorizante criatura – não é perfeito, mas atinge um ótimo resultado pelo suspense provocado com maestria pelo diretor. Há tensão de sobra e o filme nunca cai no ridículo em qualquer situação. Fiquem atentos também a presença de Sam Worthington, que deve se tornar um novo astro em Hollywood com o lançamento de  “Exterminador do Futuro – Salvação” e “Avatar”, e de Mia Wasikowska, a “Alice” de Tim Burton.

Título Original: Rogue
Ano de Produção: 2007
Direção: Greg McLean
Elenco: Michael Vartan, Radha Mitchell, Sam Worthington, Stephen Curry, Mia Wasikowska e Caroline Brazier.
Nota: 7.5

Diretor: Sean Ellis

CASHBACK_-_SEAN_ELLIS
UM EXTRAORDINÁRIO  E VISIONÁRIO NOVATO.

Assim como algumas categorias que vem sendo atualizadas mensalmente, o Cine Resenhas agora trás uma que será dedicada aos grandes diretores de cinema. Mas ao invés de termos um nome óbvio inaugurando essa nova seção no blog preferi escrever sobre o trabalho do jovem Sean Ellis. Afinal, uma das metas dessa categoria é destacar um profissional cujas realizações devem ser assistidas. O inglês nascido em 1970 na cidade de Brighton tem somente dois longas em seu curriculum. Mas são dois trabalhos que valem por uma filmografia inteira de um ou outro veterano.
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Desde cedo Sean Ellis despertou o interesse pelo cinema, embora o ápice de sua carreira tenha acontecido com o seu talento como fotógrafo. A sua primeira vez atrás das câmeras de cinema foi na realização do curta de quinze minutos “Left Turn”, um horror de 2001. Três anos depois chega o seu segundo trabalho, “Cashback”. E o diretor deve ter se surpreendido pela repercussão de sua realização, que foi indicado ao Oscar. Depois de mais um curta vem um grande desafio: tornar “Cashback” um longa-metragem. Deu que Ellis atingiu o feito, tendo ainda incluido o seu curta inteiro na história agora ampla e atualizada.
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Outro trabalho ilustre de Ellis é o recente thriller “The Brøken”, que trás ao menos dois nomes bem conhecidos, sendo os de Lena Headey (“300“) e Richard Jenkins (indicado ao Oscar 2009 pelo seu desempenho em “O Visitante”). Mas o que esses títulos oferecem para fazer com que Sean Ellis receba qualquer destaque? Bom, isso vocês só saberão conferindo aos três filmes de Ellis comentados logo a seguir, que, em suma, são experiências sensacionais e de tirar o fôlego.
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FILMOGRAFIA

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CASHBACK – 2004

No segundo curta-metragem da carreira de Sean Ellis o personagem central vivido por Sean Biggerstaff (que esteve nos dois primeiros “Harry Potter”) tem o dom de manipular o tempo. E é isto que faz durante a sua rotina como estoquista em um supermercado, paralizando as clientes e usando-as como modelos para os seus desenhos. Poético e descontraído, foi indicado ao Oscar 2006 de melhor curta.
Cotação: 3 Stars

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CASHBACK – 2006

O longa-metragem que usa o projeto de 2004 de mesmo nome em uma de suas sequências é o título com a narrativa e edição mais originais lançado no Brasil no ano passado. Há também personagens divertidos e uma história comunicativa sobre Ben (novamente Sean Biggerstaff), jovem que ao terminar a relação com a sua namorada não consegue dormir, aproveitando as noites para ser estoquista em um supermercado.
Cotação: 4 Stars

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O fato de estar incluso no recente pacote da After Dark Horrorfest chamado “8 Films To Die For” deve fazer com que “The Brøken” demore a ser lançado em nosso país, embora o filme tenha uma qualidade infinitamente superior aos outros títulos da safra, como “Efeito Borboleta 3”. É um suspense daqueles que estão cada vez mais raros hoje em dia, onde Ellis aposta muito mais em sequências perfeitamente concebidas (há uma que é pura referência à cena do chuveiro de “Psicose”) e em uma premissa perturbadora do que extravagâncias presentes em diversos exemplares do gênero.
Cotação: 4 Stars

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Passageiros

Passageiros | PassengersO diretor colombiano Rodrigo García não tem muita sorte. Desde a sua estréia como diretor com o drama “Coisas Que Você Pode Dizer Só de Olhar Para Ela” os seus projetos cinematográficos parecem não atrair muita atenção. Uma pena, pois a cada novo filme García comprova que é muito talentoso. “Passageiros”, um suspense modesto e bem interessante e que ainda traz um elenco acima da média, também não atingiu sucesso algum.

Após um tragédia aérea a terapeuta Claire Summers (Anne Hathaway, linda) atende a um pedido de Perry (Andre Braugher), que é o de reunir o pequeno grupo de sobreviventes do vôo como medida deles superarem os efeitos psicológicos posteriores ao acidente. Somente Eric (Patrick Wilson) se recusa em integrar essa equipe, embora seja o passageiro sobrevivente que terá uma relação mais afetuosa com Claire. Mas eles começam a desaparecer repentinamente e Arkin (David Morse), funcionário da companhia aérea, pode estar ligado a este acontecimento inexplicável, restando para a nossa protagonista encontrar a verdade.

“Passageiros” confere em seu clímax uma resolução bem surpreendente, que remete a alguns esplêndidos títulos do gênero que não devem ser mencionados para não trazer evidências que podem fazer com que ele seja antecipado. Mas se pode dizer o tema que as passagens finais destacam, sendo a morte. Suspicaz e dramático, o primeiro roteiro para cinema de Ronnie Christensen se sobressai pela imaginação que usa ao encaminhar os seus personagens para o grande mistério que cerca o fim de uma existência humana. E essa história é valorizada pela condução de Rodrigo García, um diretor de extrema sensibilidade.

Título Original: Passengers
Ano de Produção: 2008
Direção: Rodrigo García
Elenco: Anne Hathaway, Patrick Wilson, Andre Braugher, David Morse, William B. Davis, Clea DuVall, Ryan Robbins, Don Thompson, Stacy Grant e Dianne Wiest.
Cotação: 4 Stars

Resenha Crítica | Rumba (2008)

Rumba, de Bruno Romy, Dominique Abel e Fiona Gordon

Em lançamento que passou praticamente despercebido em nosso país, estreando nos cinemas em janeiro no Rio de Janeiro e em fevereiro em São Paulo, “Rumba”, uma comédia dirigida pelo trio formado por Dominique Abel, Fiona Gordon e Bruno Romy, merece ser descoberto pelos cinéfilos, especialmente aqueles que tem a comédia como gênero predileto de cinema. É um trabalho engraçadíssimo, extremamente criativo e que não recorre a qualquer tipo de vulgaridade para nos fazer rir. O meio que os realizadores, que também são os nomes principais do elenco, encontraram para tornar “Rumba” bem-sucedido é o humor negro.

Dom (Dominique Abel) e Fiona (Fiona Gordon) vivem um casal de professores. Ela leciona inglês para os seus pequenos alunos enquanto ele, no mesmo colégio, dá aulas de educação física. O filme inicia de forma engraçadíssima durante o expediente do casal. Chega o final de mais um dia de trabalho, ambos seguem com suas rotinas domésticas, vão dormir e, no dia seguinte, já se preparam para participar de mais um concurso de dança. Como bons profissionais, acabam levando o troféu, mas um suicida (papel de Philippe Martz) querendo ser atropelado faz com que ambos sejam prejudicados de forma trágica. Dá que eles desviam do sujeito e acabam batendo o carro fora da pista enquanto iam embora. Dom perde a memória enquanto Fiona perde uma das pernas.

O que era para ser dramático, no entanto, é a deixa para mais sequências que rendem muitas gargalhadas. Entretanto, o que faz de “Rumba” uma realização cinematográfica tão simpática são vários recursos utilizados pelos diretores e também intérpretes que parecem homenagear o cinema clássico. A imprensa especializada aponta as obras do falecido francês Jacques Tati como a fonte de inspiração de “Rumba”. Mas o trabalho com sombras, silêncio, movimentos, danças e cores transmite um ar nostálgico do velho cinema de modestos truques visuais que enriqueciam a magia. Um barato!

Título Original: Rumba
Ano de Produção: 2008
Direção: Dominique Abel, Fiona Gordon e Bruno Romy
Elenco: Dominique Abel, Fiona Gordon, Philippe Martz, Clément Morel e Bruno Romy