Resenha Crítica | Milk – A Voz da Igualdade (2008)

Harvey Bernard Milk foi o primeiro homossexual eleito a um cargo público, atuando como supervisor do município de São Francisco. A sua trajetória narrada no filme, por sua vez protagonizado por Sean Penn (que ganhou o seu segundo Oscar), que vai desde o início do seu relacionamento com Scott (papel de James Franco) até a sua trágica morte, é comandada por Gus Van Sant. O diretor assumidamente homossexual, que iniciou a sua carreira na execução de longas-metragens em 1985 com “Mala Noche”, usa o texto do vencedor do Oscar e também homossexual Dustin Lance Black para extrair um filme político que atua da mesma forma como Harvey Milk se desempenhava, protestando em favor dos direitos da minoria.

Mesmo que nos tempos atuais se note que os preconceitos diante da diferença em opções sexuais (ou mesmo de qualquer outro como raça ou credo), filmes como “Milk – A Voz da Igualdade” se fazem necessário por vivermos em uma sociedade que ainda está cega ao ponto de não abraçar o direito que os humanos têm de se relacionar com um parceiro do mesmo sexo.

Com base nesta verdade, mas ilustrando os anos 1970, “Milk – A Voz da Igualdade” se articula diante das investidas políticas de Harvey Milk, que aos quarenta anos está totalmente revoltado em ver tantas pessoas de mesma orientação sexual serem tão humilhados e desprezados como se fossem anomalias, abandonando a sua loja de revelação fotográfica em busca de algo maior. Diante de discursos públicos e movimentos pelas ruas de São Francisco, Milk consegue recrutar aliados e conquista um maior número de votos a cada eleição até conseguir se candidatar.

Só é uma pena que o diretor que constrói esse registro real seja Gus Van Sant. Ele é um bom diretor. Mas o que incomoda continua sendo a sua falta de identidade. O cineasta, que ora realiza filmes “convencionais” ora “alternativos”, parece perdido na condução de “Milk – A Voz da Igualdade”. Há grandes vacilos. A primeira cena com Milk, por sinal, já antecipa a tragédia que tomará o final, com ele usando um gravador para registrar a sua luta e como ela foi interrompida. E se o uso de documentos de época inclusos na obra não são muito bem casadas à narrativa, é estranho os cortes que sequências íntimas entre Milk e seu namorado ou amante sofrem. Harvey Milk sempre lutou por aquilo que acreditava. A sua vida no cinema merecia ser conduzida por um diretor que de alguma maneira tentasse corresponder profissionalmente a essa virtude.

Título Original: Milk
Ano de Produção: 2008
Direção: Gus Van Sant
Elenco: Sean Penn, Josh Brolin, James Franco, Emile Hirsch, Diego Luna, Alison Pill, Victor Garber e Joseph Cross

O Curioso Caso de Benjamin Button

O Curioso Caso de Benjamin ButtonVindo do universo videoclipeiro, David Fincher é hoje um dos diretores mais respeitados que atua em Hollywood. É um profissional que se preocupa por cada um dos detalhes de suas películas e com o hábito de ser grandioso e radical. Essas virtudes o fazem ser destacado por muitos cinéfilos como o melhor diretor em atividade ou o mais subestimado pelas referências de sua falta de popularidade diante do grande público. A verdade é que não se trata de um diretor extraordinário. Ele acerta ao investir em trabalhos mais modestos e sem grandes pretensões, como “Se7en” (o seu melhor filme) e “O Quarto do Pânico”. Os outros, no entanto, agregam várias imperfeições, ainda que “Clube da Luta” seja prestigiado como um dos grandes filmes cults do cinema.

Um conto de F. Scott Fitzgerald serve como base para “O Curioso Caso de Benjamin Button”. O personagem-título (Brad Pitt, em fraca performance indicada ao Oscar) foi abandonado após o parto. O motivo está relacionado a morte de sua mãe após dar à luz e a sua aparência, que se assemelha a de um idoso. A bem-intencionada Queenie (Taraji P. Henson, indicada ao Oscar pela interpretação), que o vê nas escadarias do local onde mora, acaba adotando-o e o cria como se fosse o seu próprio filho. Queenie imagina que serão poucos os dias de vida do bebê, até que ele cresce de uma forma misteriosa: ele rejuvenesce fisicamente, abandonando a sua fisionomia envelhecida com o passar dos anos. Mas essa história se desenvolve em forma de flashbacks, com Caroline (Julia Ormond, lamentavelmente desperdiçada) lendo o diário de Benjamin Button a pedido da sua mãe à beira da morte Daisy (Cate Blanchett, deslumbrante).

Somando ao todo treze indicações na última edição do Oscar, sendo considerado também nas categorias de melhor diretor e melhor filme, o drama conquistou somente os prêmios de Direção de Arte, Maquiagem e Efeitos Especiais, categorias técnicas que de fato impressionam. Mas é aí que “O Curioso Caso de Benjamin Button” encontra os seus limites. É um cinema de fato grandioso, repleto de mínimos detalhes, mas não verdadeiramente emocionante. Com esta história mágica, David Fincher poderia ter realizado um longa belo sobre a celebração da vida humana. Estão lá todos aqueles elementos que sempre cercam cada um de nós, especialmente o amor como o maior trunfo e a morte como a maior tristeza em toda uma existência. Mas eles são neutralizados por causa da condução pouco carinhosa para essa história.

Título Original: The Curious Case of Benjamin Button
Ano de Produção: 2008
Direção: David Fincher
Elenco: Brad Pitt, Cate Blanchett, Julia Ormond, Taraji P. Henson, Jason Flemyng, Phyllis Somerville, Elle Fanning, David Ross Paterson, Taren Cunningham, Tilda Swinton e Elias Koteas.
Cotação: 3 Stars

Wendy and Lucy

Wendy and Lucy
Quando há pouco dinheiro investido na realização de um longa-metragem, um diretor, geralmente também assumindo a função de roteirista, consegue moldar a sua produção ao seu modo, deixando uma marca autoral. É o que Kelly Reichardt, diretora com expressiva contribuição para o cinema independente (mas cujas obras como “River of Grass” e “Antiga Alegria” não receberam sequer a chance de ser lançadas em nosso país em DVD), faz. “Wendy and Lucy”, onde se estima que o seu custo não ultrapassou o valor de quinhentos mil dólares, tem um formato simples, história que abre poucos espaços para revelações, mas que comove o espectador se este se deixar levar pelo filme.

A premissa se resume ao companheirismo da jovem Wendy (Michelle Williams) com a sua cadela Lucy. O seu destino é chegar ao Alaska e ela tem um velho carro e pouco dinheiro para isto. Em uma conversa com um velho vigia (Wally Dalton, ótimo) vemos que Wendy quer ter uma vida por lá. Só que não sabemos exatamente o que faz ela seguir com a sua solitária jornada, só tomamos conhecimento da Wendy que faz uma parada obrigatória em Oregon por conta do carro que apresenta problemas e da sua Lucy que desaparece enquanto responde pelo flagrante de furto em um supermercado.

Mas não se trata de um filme vazio. Michelle Williams como protagonista apresenta um trabalho arrebatador, no seu melhor papel e desempenho em toda a carreira. A sua interpretação permite que nos coloquemos em seu lugar. É possível deduzir que Wendy, anterior ao momento de sua vida narrado no filme, passou por um acontecimento que a deixou com sentimentos bem tumultuados. Isto é patente diante da sua relação com Lucy, talvez o único ser com que ela possa contar com a companhia e com a confiança. Os seus olhares profundos, sua voz suave mas triste entregam uma mulher sem um rumo, solitária e que a todo momento sabe que terá que aumentar as suas economias para conseguir atingir os seus objetivos.

E com isso Kelly Reichardt obtêm um feito surpreendente, que é o de observemos Wendy não somente como uma personagem, mas como uma pessoa que poderia existir de verdade. É um filme melancólico (o clímax, centrado em uma escolha de Wendy, é de partir o coração). Mas também é lindo com o poder que tem de transmitir as emoções de sua personagem central com tanta profusão.

Título Original: Wendy and Lucy
Ano de Produção: 2008
Direção: Kelly Reichardt
Elenco: Michelle Williams, Wally Dalton, Will Patton, John Robinson, Will Oldham e Larry Fessenden.
Nota: 8.5