.:: 40ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo ::.
Apesar das comédias brasileiras serem lançadas quase que semanalmente, é raro uma produção do gênero fazer parte da Mostra Brasil. Dirigido por Santiago Dellape, “A Repartição do Tempo” obtém esta honraria oferecendo ao público uma experiência cômica que definitivamente sai do lugar comum ao introduzir elementos fantásticos na dinâmica de um grupo de funcionários públicos de um órgão de registro de patentes e invenções, o REPI.
Presente na Mostra para apresentar “A Repartição do Tempo” no último sábado, 22, Santiago Dellape agora nos concede uma entrevista detalhando algumas curiosidades e desafios que o cercaram em sua estreia na direção de um longa-metragem. E vale reforçar: os cinéfilos paulistanos ainda terão mais uma chance de assistir ao filme na Mostra, com sua sessão de despedida marcada para 1º de novembro, terça-feira, às 13h30 no Frei Caneca.
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“A Repartição do Tempo” surge em um momento no qual a comédia brasileira testa novas fórmulas e visualiza possibilidades fora do eixo Rio-São Paulo. Como reflete a respeito de sua contribuição para essa mudança de paradigmas?
Acho que nossa contribuição vai mais no sentido de dar à comédia brasileira um mínimo fundo de reflexão, no qual questões sérias como burocracia, funcionalismo público e nepotismo podem sim ser colocadas sem comprometer o riso. Entendo que às vezes a comédia seja considerada um gênero menor, pois a maioria delas tem viés puramente comercial e pouco compromisso com o cinema de autor. Mas gosto de pensar que há sim uma assinatura minha e do roteirista Davi Mattos na “Repartição”, que já se delineia desde nossa primeira colaboração em “Nada Consta” (2006) passando por curtas nebulosos, até amadurecer em “Ratão” (2010), que ganhou prêmio de público em Gramado.
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As piadas funcionam especialmente por evidenciar a burocracia das competências de funcionários públicos e o nepotismo nos cargos de gestão. Os comentários críticos por trás do humor foram uma prioridade na concepção do roteiro?
Enquanto roteiristas, nossa prioridade é sempre a narrativa, acima de tudo. Se ela terá um fundo crítico ou se vai se permitir ser meio alienada, tanto faz. Não temos nenhum problema com a segunda opção, inclusive: foi o que fizemos em “Ratão”, que, afinal de contas, não critica muita coisa, apenas diverte. Definitivamente estamos comprometidos em entreter o nosso público, em criar uma diegese forte o suficiente para envolvê-lo completamente. É claro que se existe um viés crítico e reflexivo por trás empurrando a trama, o filme ganha em significado e sofisticação, a partir do momento em que a ele vão se adicionando essas camadas.
Em “A Repartição do Tempo”, temos ao menos dois elementos atípicos em nossa cinematografia: a inserção de elementos fantásticos que se materializam a partir de efeitos visuais e o uso da animação em formato de quadrinhos, esta inclusive ditando os destinos dos personagens. Foi um desafio administrar esses recursos técnicos? Certamente foi um desafio conjugar efeitos especiais e animação, até porque são elementos com os quais pouco trabalhei ao longo de minha carreira. Como diretor, sempre me senti mais à vontade filmando “live action”. Mas foi ótimo ter saído da minha zona de conforto e encarado esse desafio, aprendi muito. Além disso, não seria possível contar a história de “A Repartição do Tempo” sem essas ferramentas, então não nos restou outra escolha. Fiquei muito satisfeito com o resultado e verdadeiramente orgulhoso de ter executado essa etapa da finalização inteiramente em Brasília, sem ter de recorrer a soluções importadas do eixo Rio-SP. Vejo que o cinema brasiliense atingiu a maturidade e prova disso é o Prêmio Netflix que a cidade acaba de levar pelo filme “O Último Cine Drive In”, de Iberê Carvalho. Na “Repartição”, os créditos vão para Grillo VFX (efeitos especiais), Please No e Lojinha de Filmes (animação) e Flávia Lima, ilustradora de apenas 22 anos que surpreendeu a todos com seu talento e dedicação.
Após o Festival de Brasília e a Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, quais são as próximas paradas de “A Repartição do Tempo”? Já há uma previsão para o lançamento comercial?
O público de SP terá uma última oportunidade de assistir ao filme na Mostra: será na próxima terça, dia 1/11, às 13h30, no Espaço Itaú Frei Caneca. Três dias depois (4/11, sexta), “A Repartição do Tempo” passa no Rio de Janeiro, na seleção do Rio Fantastik Festival, com exibição simultânea às 20h no Cine Joia Copacabana e Rio Shopping. E no começo de dezembro o filme volta a SP para participar de um painel na Comic Con no dia 3/12, às 12h30, com a presença do ilustre Dedé Santana. A previsão de lançamento comercial é maio de 2017 — quer dizer, se não estiver faltando nenhum nada consta!