Hannah, de Andrea Pallaoro
Mesmo ciente do jogo comercial envolvendo cinema, como o de promover o projeto que participa e o de oferecer o seu nome e face para uma campanha promocional, um verdadeiro intérprete é aquele que reconhece que é apenas um dos vários mecanismos de um filme, sempre a disposição para atender à visão de seu realizador. No entanto, é impossível não afirmar que é na presença da veterana Charlotte Rampling que orbita todas as engrenagens de “Hannah”.
Resgatada em 2000 por François Ozon para protagonizar “Sob a Areia”, a inglesa fluente em francês tem no segundo longa-metragem do italiano Andrea Pallaoro um dos grandes desempenhos de sua notável carreira. Não à toa, saiu laureada do júri do Festival de Veneza do ano passado presidido por Annette Bening com o Volpi Cup de Melhor Atriz.
No primeiro ato silencioso de “Hannah”, vemos essa personagem-título em seu último dia no apartamento com o marido (interpretado por André Wilms), que será preso por um crime nunca elucidado explicitamente pelo texto escrito por Pallaoro e Orlando Tirado. Porém, quem parece em uma reabilitação sem chance de perdão é a própria Hannah.
Com a companhia de um cachorro que não corresponde às suas necessidades de afeto, Hannah prossegue a vida em dias insípidos. Espécie de diarista de uma mulher bem-sucedida com um filho, ela encontra no tempo livre que resta o interesse por aulas de atuação, uma clara tentativa de fuga da realidade.
Porém, o mais cruel para Hannah é a rejeição paulatina de todos que a conhecem, principalmente o seu filho Nicholas (Simon Bisschop), que passa a ignorá-la após o aparente escândalo do crime cometido por seu pai. Seria Hannah uma cúmplice? Ou foi alguém que chegou à meia-idade errando ao possivelmente viver em função de seu marido?
O espectador não precisará de respostas para essas e outras perguntas porque não há nada mais doloroso e, ao mesmo tempo, fascinante do que testemunhar a dor expressa na face de Hannah/Charlotte Rampling, que também não se furta de se desnudar para expor todas as marcas da idade. Um filme totalmente dependente de sua atriz e que definitivamente são seria tão gigante quanto é caso se negasse a essa escolha.
