
Em 2019, o diretor Mike Flanagan conseguiu o que parecia impossível ao adaptar “Doutor Sono”, onde foi fiel até determinado ponto ao texto literário para depois traçar um caminho inédito em busca da conciliação entre o filme “O Iluminado” e o seu autor, Stephen King.
Cinco anos depois, o retorno dessa parceria, que agora se dá com a transposição para cinema de um conto não tão popular de King, vem para reforçar algo que tínhamos esquecido: ainda que seja um mestre da literatura de horror, o escritor tem também em seu arsenal histórias agridoces e existenciais.
Ainda que grande parte das interações entre os personagens de “A Vida de Chuck” sejam pautadas por matemática, Carl Sagan e o desejo de acessar segredos ocultos, eis aqui um filme em que a escolha por uma explicação mais racional ou mesmo fantástica do que aqui acontece cabe efetivamente para o espectador, que ao seu modo dará o significado que deseja a essa narrativa em três atos iniciados ao contrário.*
É mais um belo trabalho do diretor, que felizmente tem aqui a oportunidade de se desvincular temporariamente do gênero que está confinado – o terror – para pensar com diferentes tons e cores sobre a condição humana tanto em um mundo (ou deus em forma humana?) em pane quanto inebriado pela doçura da vida em sua juventude, ainda que esta esteja com o luto sempre à espreita.
*A ordem inversa da narrativa, sustentada com maestria por Mike Flanagan (que também monta o seu filme), de certo modo me fez pensar como funciona perfeitamente como uma oposição justamente às escolhas que mais subtraem do que somam no também recente “A Hora do Mal”, onde, para mim, Zach Cregger teve a péssima escolha de pautar a evolução de seu roteiro a partir de capítulos baseados em seus personagens principais e secundários. Dois filmes muito bons para se pensar o cinema partindo de um pensamento sobre organização pouco tradicional de histórias.
★★★★
Direção de Mike Flanagan
Em exibição nos cinemas (Diamond Films Brasil)
