Resenha Crítica | 1945 (2017)

1945, de Ferenc Török

.:: 41ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo ::.

Existia uma máxima em Hollywood de que as produções com histórias ambientadas na Segunda Guerra Mundial automaticamente ganhavam o clamor não somente do público, quanto também dos integrantes de importantes comitês de premiações de cinema. Os americanos esgotaram a fonte de possibilidades, mas os estrangeiros seguem encontrando narrativas de interesse para rediscutir um episódio obscuro na história recente da humanidade.

O diretor e roteirista Ferenc Török se volta em “1945” para um contexto pouco explorado na ficção: o período em que o domínio nazista se enfraquecia. Na Hungria aqui registrada, estamos precisamente em agosto de 1945, um mês antes do fim da guerra. Com isso, faz um drama muito mais interessado em flagrar a moralidade de seus personagens do que necessariamente ao conflito armado.

Em um panorama com inúmeros personagens, as lentes de Török se voltam inicialmente para um evento que move o vilarejo que todos habitam, sendo os preparativos para o casamento de Árpád (Bence Tasnádi) e Kisrózsi (Dora Sztarenki). A naturalidade com a qual a união está prestes a ser celada é arranhada com a presença de dois judeus ortodoxos, que são pai e filho (interpretados por Ivan Angelus e Marcell Nagy).

A partir disso, “1945” começa a se aprofundar na dinâmica privada dos personagens que orbitam nesse ambiente, deflagrando mentiras, traições e perversidades até então invisíveis. A condução é quase a mesma de “A Fita Branca”, da adoção da fotografia em preto e branco de Elemér Ragályi (vencedor do Emmy pelo telefilme da HBO “Rasputin”) até de uma frieza que impossibilita um mínimo de envolvimento emocional.

Resenha Crítica | Era o Hotel Cambridge (2016)

Era o Hotel Cambridge, de Eliane Caffé

.:: 40ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo ::.

Fundado em 1950, com 15 andares e mais de 100 apartamentos, o Cambridge Hotel foi somente um dos vários endereços para hospedagens em São Paulo que foram perdendo o apelo com o avanço do tempo e da urbanização. Desprestigiado, encerrou as suas atividades em 2004, com apenas o bar localizado em seu andar térreo em funcionamento.

O destino do endereço é encenado por Eliane Caffé em “Era o Hotel Cambridge”, em que exibe, com câmeras quase documentais, um sem número de famílias tomando os espaços do edifício, inutilizado mesmo com o decreto em 2010 do então prefeito Gilberto Kassab que o categorizou como imóvel de interesse social. Ao longo de uma hora e meia, acompanhamos esses indivíduos de baixa renda ou refugiados de outros países na tensão diária de habitar uma área em que a qualquer momento podem ser chutados pelas autoridades.

Para dar veracidade ao registro, Caffé faz uma escalação de elenco que contempla desde veteranos como José Dumont e Suely Franco até atores não-profissionais, borrando ainda mais os limites entre a ficção e a realidade. Também estabelece contrapontos entre as encenações artísticas que tomam o cenário com a mobilização popular liderada pela FLM (Frente de Luta pela Moradia).

Mesmo com esse tom quase experimental, a sensação que “Era o Hotel Cambridge” provoca ao final é que os seus derradeiros minutos soam mais fortes do que todos os esforços de Caffé em igualar a realidade do contexto. Há bons flagras, como aqueles em que os refugiados conversam com os seus familiares distantes por Skype ou quando a personagem interpretada pela ativista Carmen Silva condiciona pessoas brandando “entra para a casa de vocês!” durante uma invasão noturna. Mas nada igualmente catártico quanto as imagens autênticas de manifestações e de prédios apropriados com faixas de inúmeros movimentos pela moradia.

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Lançamento em streaming:
Disponível a partir do dia 15 de março | 
Google Play (Venda: R$19,90 – Aluguel: R$11,90) | iTunes (Venda: R$19,90 – Aluguel: R$11,90)

Resenha Crítica | Uma Espécie de Família (2017)

Una especie de familia, de Diego Lerman

.:: 41ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo ::.

Realizador de “Olhar Invisível” e “Refugiado”, Diego Lerman se lança em “Uma Espécie de Família” a um projeto que traça uma estratégia que deverá ser cada vez mais habitual para a produção independente: a de permitir não apenas que produtores de nacionalidades diferentes viabilizem um filme, como também a de uma equipe de trabalho diversificada. Além da participação argentina, o longa conta também com investidores vindos do Brasil (sendo um deles Paula Cosenza, da Bossa Nova Films – assista entrevista aqui), Alemanha, Dinamarca, França e Polônia.

Os abismos sociais assumem o palco de todos esses países, mas é a Buenos Aires que é selecionada aqui para apresentá-los a partir de uma abordagem particular. Trata-se das transações ilegais no processo de adoção de recém-nascidos. em que famílias pobres, quase miseráveis, vendem os bebês de concepções indesejadas.

Incapaz de gerar uma criança, Malena (Bárbara Lennie), recebe uma ligação de que o bebê que adotou nasceu. Parte ao seu encontro acompanhada pelo marido, Mariano (Claudio Tolcachir), que às vezes não sinaliza tanto quanto ela o interesse em ter um filho.

O conflito se impõe quando os pais de Marcela (Yanina Ávila), a mãe da criança, passa a exigir que uma quantia superior a combinada seja paga por Malena e Mariano para a consolidação do acordo. Caso o contrário, entregarão o recém-nascido ao orfanato. Desenha-se assim um cenário em que a necessidade, seja ela emocional ou financeira, borra as linhas éticas, mas há também um delicado retrato sobre como a maternidade contribui para pisotear limites.

A relação entre Malena e Marcela contempla até mesmo uma influência bíblica no enredo, rendendo uma cena espetacular de nuvem de gafanhotos fazendo alusão a uma das dez pragas do Egito. São saídas visuais que somam para a autenticidade de uma narrativa liderada com força por Bárbara Lennie, uma das melhores atrizes em atividade, e Yanina Ávila, estreante com uma desenvoltura de quem entende do riscado.

Resenha Crítica | A Repartição do Tempo (2016)

A Repartição do Tempo, de Santiago Dellape

.:: 40ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo ::.

A fórmula que vem assegurando o sucesso da comédia brasileira nos últimos anos é a exploração das crises financeiras, profissionais e matrimoniais da classe média brasileira, justamente o público que mais vai ao cinema para os males espantar dando risada daquilo com o que se identifica. Primeiro longa-metragem de Santiago Dellape, “A Repartição do Tempo” será lançado no circuito comercial como se fosse um exemplar alternativo do nosso cinema, mas merecia centenas de cópias não somente pelo seu apelo, como também pelo seu humor incisivo.

É, portanto, superior a tudo o que Roberto Santucci já fez. Não apenas se comunica com o espectador, mas é realmente muito bom. Guardadas às devidas proporções, lembra muito o que Alexandre Machado e Fernanda Young fizeram com acidez nos sete episódios de “Os Aspones” nos idos 2004, com uma dose extra de imaginação ao inserir a história no campo do fantástico.

Protagonista da história, Jonas (Edu Moraes) se vê inserido em uma rotina de desencantos com outros colegas de trabalho em uma repartição pública em Brasília identificada como REPI: Registro de Patentes e Invenções. É para ela que vai o protótipo de uma máquina do tempo do Dr. Brasil (Tonico Pereira) para registro, usado às escondidas pelo chefe do local, Lisboa (Eucir de Souza), com a intenção de fazer com o que os resultados de produtividade subam.

A partir dessa premissa, Dellape se deixa nortear por obras oitentistas que certamente são essenciais para a formação de qualquer cineasta que ambiciona por uma carreira na comédia, de “Os Trapalhões” a “De Volta Para o Futuro”. Com as inspirações, visualiza rumos inusitados para o progresso da narrativa, fazendo Lisboa duplicar os seus subordinados com a máquina do tempo para que as cópias usurpem os seus lugares enquanto confina os originais em um departamento subterrâneo para trabalharem pesado em caráter de licença-prêmio.

É também um excelente diretor de elenco, exibindo atores pouco conhecidos que funcionam perfeitamente em conjunto e cada um com grandes cenas que comprovam como são craques no humor, com destaque especial para Bidô Galvão como Betânia, veterana no REPI. Há até uma participação especial de Dedé Santana, aqui com um personagem diferente do que estamos habituados a vê-lo.

O melhor, contudo, é a perícia de um realizador que sabe muito bem o ambiente que está registrando. Também um funcionário público, Dellape encontra nos pequenos detalhes um potencial cômico enorme, da burocracia do serviço público (as ligações telefônicas prolongadas, os inúmeros procedimentos para o atendimento de uma solicitação) ao sentimento de estar preso em atribuições inúteis que sugam a vitalidade dos personagens, encontrando nas confraternizações regadas a Cereser e na fila para bater cartão um refúgio. A melhor comédia nacional em muito tempo.

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+ Entrevista com o diretor e roteirista Santiago Dellape

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Lançamento em streaming:
Disponível a partir do dia 22 de março | 
Google Play (Venda: R$19,90 – Aluguel: R$6,90) | iTunes (Venda: R$22,90 – Aluguel: R$11,90) | NOW (Aluguel: R$14,90)

Resenha Crítica | The Square: A Arte da Discórdia (2017)

The Square, de Ruben Östlund

.:: 41ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo ::.

A mobilização contra o fazer artístico não é uma pauta em discussão somente no Brasil. Uma onda conservadora se alastra no país e no mundo e a arte tem sido um dos principais alvos de ataque. Como bem anuncia em seu subtítulo exclusivamente brasileiro, “A Arte da Discórdia”, “The Square” acalora o debate.

É um aspecto que provavelmente foi determinante para o júri do último Festival de Cannes liderado por Pedro Almodóvar conferir para o sueco Ruben Östlund a Palma de Ouro de Melhor Filme. Raciocínio parecido teve em 2015 o júri de Joel e Ethan Coen, que laureou “Dheepan: O Refúgio” em um período em que a crise de refugiados emergia.

Ambos cometeram o mesmo erro, privilegiando uma obra muito mais pelo contexto em que está inserido e menos por demais aspectos, como mesmo a relevância com o qual se constrói a partir de uma pauta atual. Soa até mesmo questionável o tom adotado por Östlund em seu “The Square: A Arte da Discórdia”, atingindo níveis de infantilidade gravíssimos.

A princípio, a via-crúcis atravessada por Christian (Claes Bang), curador de um museu de arte contemporânea, rende mesmo algumas risadas pelas situações de desconforto em que está centralizado – quando não bizarras. Há tanto a jornada que inicia para reaver um celular roubado quanto as consequências de um flerte com uma jornalista americana, Anne (Elisabeth Moss).

Tais acasos de sua vida privada confluem com a preparação de uma nova exposição, O Quadrado, que gera polêmica a partir de uma campanha publicitária lançada para o público que causa um tremendo alvoroço por envolver uma menina e uma explosão. Apenas a primeira das várias pedras de dominó que despencarão até deixar Christian em uma situação profissional muito delicada.

Com “Força Maior“, Östlund havia entregado um dos grandes filmes de 2014 ao trazer um protagonista um tanto parecido com Christian, que se via desacreditado por sua família por causa de uma atitude nada heroica em uma avalanche. Aqui, uma figura intelectual, respeitável, vai sucumbindo às circunstâncias ao ponto de se encontrar literalmente no lixo.

Fazia todo o sentido em “Força Maior” expôr a masculinidade dos homens, falsa quando estão em uma situação de sobrevivência. Em “The Square: A Arte da Discórdia”, é difícil acreditar em Christian como um homem crível, ainda que Claes Bang, dinamarquês que será visto em “A Garota na Teia de Aranha”, o interprete com a maior dignidade possível. Se não bastasse, há ainda uma conclusão desapontadora, que parece deixar a deus-dará tudo o que se fermentava previamente.

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Lançamento em streaming:
Disponível a partir do dia 22 de fevereiro
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Os 10 Melhores Filmes Brasileiros de 2017

O Cine Resenhas nunca teve uma oportunidade tão grande quanto em 2017 para prestigiar o cinema nacional. Graças ao acesso proporcionado para fazer entrevistas com diretores e intérpretes, dando novo fôlego a um trabalho de cobertura que logo completará 11 anos. Portanto, nada melhor do que celebrar esse passo tão importante para o nosso histórico preparando pela primeira vez no espaço um top 10 com as melhores produções brasileiras lançadas no último ano, seguida de comentários e links complementares para análises na íntegra e entrevistas cedidas.

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#10. Beduíno, de Júlio Bressane

Bressane pode continuar a defesa de que “Beduino”, assim como qualquer outro filme com a sua assinatura, sobre nada se trata. Mas o que não falta aqui é substância nos atritos que pautam as inúmeras personificações de Alessandra Negrini e Fernando Eiras. Em comum, as identidades femininas partilham o tom de malícia dos diálogos de natureza literária de Negrini, enquanto as masculinas sinalizam uma inquietação não verbalizada por Eiras.

Outra vez, o velho e o novo confluem. Ele gosta de coisas antigas. Ela é moderna. O corpo de Negrini é matéria para tomadas exuberantes, possíveis pela flexibilidade de um novo suporte – como também o é para ressuscitar “Memórias de um Estrangulador de Loiras”, filme maldito produzido pelo cineasta em exílio em 1971. Um artista plenamente consciente de sua bagagem, encontrando no hoje um meio de prosseguir eloquente e renovado.

+ Análise na íntegra
+ Os 10 Melhores Filmes da 40ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo.

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#9. Bingo: O Rei das Manhãs, de Daniel Rezende

Selecionado para concorrer ao Oscar 2018 de Melhor Filme Estrangeiro, o filme de Daniel Rezende ficou de fora da lista de semifinalistas divulgada em dezembro. Isso não significa que o Brasil não tenha acertado em sua escolha de representante. Indicado ao Oscar pela montagem de “Cidade de Deus”, Daniel Rezende faz uma estreia segura na direção de longa-metragem, ainda que tenha que prestar contas ao roteiro de Luiz Bolognesi que por vezes enaltece demais a figura real de Arlindo Barreto, responsável por vestir o figurino do palhaço Bozo enquanto afundava em sua vida privada. Vibrante na maior parte do tempo não somente por sua impecável reconstituição de época, como também no modo como acompanha o ápice e queda de um homem em luta para assumir o protagonismo com o seu talento, aqui interpretado por Vladimir Brichta em seu melhor momento.

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#8. Vermelho Russo, de Charly Braun

O diretor Charly Braun já havia com “Além da Estrada”, o seu primeiro longa de ficção, explorado a posição de quem está em uma “terra estranha”. Aqui, ele embaralha ainda mais o estranhamento que isso provoca propondo um experimento em que a linha que separa o verídico da ficção é borrada. Como se percebe, Martha Nowill (que inclusive teve o seu diário de viagem para a Rússia em tempos distintos como base para a elaboração do roteiro) e Maria Manoella emprestam versões de si mesmas e a dúvida sobre o núcleo coadjuvante ter se submetido a esse jogo permanecerá após o rolar dos créditos finais.

Porém, a principal virtude de “Vermelho Russo” é encontrar um ápice em que o espectador seja capaz de se conectar com a história narrada sem necessariamente pertencer ao nicho das artes que se encena. A proposta não é nem um pouco pretensiosa e o seu registro, por vezes documental, encontra a beleza sem necessariamente se prender a cartões-postais. No fim das contas, assim como Martha e Maria, estamos todos inseridos em um tablado em busca de algum equilíbrio.

+ Análise na íntegra
+ Entrevista com as atrizes Martha Nowill e Maria Manoella
+ Entrevista com o diretor Charly Braun

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#7. Martírio, de Vincent Carelli

É de se exaltar que a questão indígena esteja em pauta em nossa cinematografia. Na ficção, ela foi trabalhada de forma central em “Antes o Tempo Não Acabava” e “Não Devore Meu Coração!”. No documentário, tivemos “Taego Ãwa” e “Martírio”, este sendo o melhor desse recorte específico. Nascido na França, Vincent Carelli transforma anos de pesquisa antropológica em um atestado sobre a comunidade Guarani Kaiowá, em processo de extinção devido aos interesses territoriais do agronegócio. A longa duração do registro não apenas faz uma cobertura completa de um extermínio sustentado e ignorado por anos, como reflete a longa caminhada por um desejo de justiça que parece que jamais se concretizará.

+ Os 10 Melhores Filmes da 40ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo

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#6. Axé: Canto Do Povo De Um Lugar, de Chico Kertész

Não se testemunhou sessão de cinema mais vibrante do que a da première de “Axé: Canto Do Povo De Um Lugar” na Mostra Internacional de Cinema em São Paulo de 2016. Com a presença de Daniela Mercury na plateia, a sensação era a de estar diante do show que a própria cantora fez nos anos 1990 no Vão Livre do MASP, evento que parou toda a Avenida Paulista. Não foi à toa. O registro documental de Chico Kertész reacende o interesse pelo gênero musical baiano com um forte sentimento de nostalgia, do seu nascimento até as vozes que ainda o sustenta de forma remodelada. Até os mais avessos ao axé se verão cantarolando e com vontade de dançar com as músicas de Luiz Caldas, Olodum, Araketu, Ivete Sangalo, É o Tchan!, Netinho e tantos outros.

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#5. Waiting For B., de Abigail Spindel e Paulo Cesar Toledo

Exibido no último Festival MixBrasil de Cultura da Diversidade, este documentário acerca dos fãs que acamparam durante dois meses para assistir ao show da Beyoncé em 2013 no Estádio do Morumbi é daqueles que desfazem qualquer preconceito com jovens com uma devoção extrema por uma artista. Isso acontece porque os codiretores Abigail Spindel e Paulo Cesar Toledo fazem um mapeamento perspicaz da vida privada de cada um deles, inseridos em cenários que nem sempre autorizam que externem quem verdadeiramente são, encontrando em um talento da música uma opção de fuga da realidade. Muito além disso, “Waiting for B.” é extremamente divertido ao acompanhar uma pequena comunidade se formando dentro de uma cabana em que confidências, piadas e demonstrações de amizade são trocadas sem reservas.

+ Análise na íntegra
+ Entrevista com a codiretora Abigail Spindel

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#4. Deserto, de Guilherme Weber

Em seus melhores momentos, “Deserto” apresenta um caráter bem provocativo na reorganização do seu microcosmo, por vezes evocando inclusive “Manderlay”, de Lars von Trier. Cedo ou tarde, todos esses artistas vão protagonizar ações movidos pela cobiça ou necessidade, revelando não somente o instinto primitivo característico de nossa natureza, mas também a consequência de se aprisionar em modelos pré-estabelecidos.

A esse contexto, encenado em um cenário com traços pós-apocalípticos, vem a esplendorosa fotografia do português Rui Poças, parceiro constante de João Pedro Rodrigues (“O Ornitólogo”) e Miguel Gomes (“Tabu”) em sua primeira contribuição na cinematografia brasileira, transformando cada plano em uma verdadeira pintura. Como elemento anacrônico, vem a música da banda “Beijo AA Força”, “A Partida”, estabelecendo laços desconfortáveis com nossa contemporaneidade.

+ Análise na íntegra
+ Entrevista com o diretor Guilherme Weber
+ Entrevista com os atores Cida Moreira e Marcio Rosario

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#3. As Duas Irenes, de Fabio Meira

A premissa de vida dupla ganha uma abordagem extremamente original pelas mãos de Fabio Meira em “As Duas Irenes”, a sua estreia como diretor de longa-metragem já carregando a distinção de ter sido exibido em uma mostra paralela do Festival de Berlim. Sem recato, registra o cotidiano das Irenes vividas por Priscila Bittencourt e Isabela Torres quando a primeira descobre ser irmã da segunda, consequência de um pai, Tonico (Marco Ricca), que mantém em segredo o fato de ser o chefe de duas famílias. A pré-adolescência é talvez o período de maiores incertezas da existência humana e Meira se apropria disso para inclusive discutir sobre identidade, aqui fragmentada pelo espaço que se ocupa e o que se deseja habitar, pelos desejos na puberdade e até por um contexto de valores que parecem perdidos no tempo. A conclusão é particularmente extraordinária.

+ 9 Perguntas Secretas com Priscila Bittencourt e Isabela Torres
+ Entrevista com as atrizes Priscila Bittencourt e Isabela Torres
+ Entrevista com a atriz Inês Peixoto

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#2. Como Nossos Pais, de Laís Bodanzky

Laís Bodanzky promoveu “Como Nossos Pais” sob a tese de que o seu filme defenderia um novo modelo de mulher que se reconfigura em nossa contemporaneidade, não mais conformada com as convenções de esposa, mãe e dona do lar. Rosa (Maria Ribeiro) se vê mesmo nessa situação. De tão insatisfeita, não há uma cena em que não a flagramos à beira de um ataque de nervos. Mas “Como Nossos Pais” é tão mais que isso. Trata também, evidentemente, sobre a influência que a nossa geração passada exerce sobre nós e, principalmente, sobre a necessidade de se permitir a uma liberdade nem sempre possível com as responsabilidades assumidas para toda a vida e compreendida quando de fato batemos de cara com a sua finitude, aqui na forma implacável da mãe de Rosa interpretada pela grande Clarisse Abujamra.

+ Entrevista com a diretora Laís Bodanzky e a atriz Maria Ribeiro

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#1. Animal Político, de Tião

Tião, uma assinatura ostentada como diretor e roteirista por si só incomum, sabe como causar um efeito desnorteador, sendo astuto o suficiente para refletir sobre a banalidade de nossa existência impondo uma figura que embaralha as nossas certezas. A essa escolha, vem uma estrutura que quebra a linearidade do primeiro ato com uma nova história aparentemente individual, “A Pequena Caucasiana”, em que a ruiva Elisa Heidrich caminha totalmente nua aguardando desde a infância que alguém a resgate em uma ilha deserta.

Há outras ideias geniais no curso de “Animal Político”, como associar um livro da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) como uma espécie de bíblia ou monumento para atingir a sabedoria suprema sobre o sentido da vida. Há também uma reencenação de “2001: Uma Odisseia no Espaço”, dando ênfase ao nosso processo evolutivo. Muito mais que cômicas, tais estranhezas agregam muito peso para devaneios essencialmente mundanos, todos a serviço de uma realização que compreende que o experimentalismo vem mais de uma retirada temporária da zona de conforto e menos de uma agressão aos sentidos e intelectualidade. Desde já, um dos melhores filmes nacionais do ano.

+ Análise na íntegra

Os 10 Melhores Filmes da 41ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo

Seguindo a tradição de edições anteriores da Mostra Internacional de Cinema em São Paulo, o Cine Resenhas convocou alguns colegas de blogosfera e de encontros e desencontros durante a maratona de filmes para contribuir com o levantamento dos melhores da 41ª edição produzido a seguir. Dentro de uma programação com quase 400 títulos, chegamos à lista com os 10 mais celebrados – excetuando curtas e retrospectivas, as demais produções foram elegíveis para votação.

A ordem do décimo ao primeiro colocado foi estabelecida com base nas posições em que os filmes se apresentaram dentro de cada relação individual, devidamente disponível na última parte desta publicação. Ainda que não tenha sido necessário somar a quantidade de menções de cada um como critério de desempante (como aconteceu no ano passado, no qual “Elle” e “Martírio” contavam com a mesma pontuação, mas com quantidade diferente de citações), a informação está presente ao lado dos pontos obtidos.

O Cine Resenhas agradece a participação dos 19 convidados para este ano e aproveita para recomendar ao leitor a visita em seus endereços, devidamente lincados nas listas individuais.

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10º Lugar
The Square, de Ruben Östland 
36 pontos | 7 menções

Muito se falou como “The Square” questiona o limite da arte, e mesmo da arte performática e da própria liberdade de expressão. Mas embora esse seja um dos pontos centrais do filme, ele funciona melhor quando aborda as dinâmicas sociais de relacionamento. Com um humor ácido, pontuado pelo uso da música “Ave Maria”, que dialoga como o nome do protagonista do mesmo modo como suas ações criam antíteses com ele, a narrativa é mais eficiente em sua primeira metade, no sentido de deixar claro o que pretende dizer. O resultado é uma obra provocativa e instigante. + [Isabel WittmannEstante da Sala]

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9º Lugar
Arábia, de Affonso Uchôa e João Dumans 
41 pontos | 5 menções

Em momento de reformas trabalhistas baseadas na invisibilização daqueles que são os principais afetados por elas, um filme como “Arábia”, em toda sua profundidade, chega justamente para descortinar a barreira que políticas velhas liberais insistem em criar. Ao expor, de maneira simples e muito orgânica, as andanças de Cristiano por Minas Gerais, traz a realidade para que seja vista por todos, próximos e distantes, conhecedores e ignorantes daquele que é o cotidiano de tantos brasileiros. + [Cecilia BarrosoCenas de Cinema]

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8º Lugar
O Amante de Um Dia, de Philippe Garrel 
50 pontos | 8 menções

Garrel segue interessado pela dubiedade dos relacionamentos amorosos, pelas inconstâncias humanas a partir dos desejos de cada um, através daquele delicado toque anacrônico e melancólico, só que firmado nos dias atuais – algo já tanto reprocessado por ele mesmo, mas em ambientação sempre muito gostosa de revisitar. [Rafael CarvalhoMoviola Digital]

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7º Lugar
Três Anúncios Para Um Crime, de Martin McDonagh 
52 pontos | 7 menções

Sem abrir mão do seu humor desconcertante, desse em que o espectador repensa sobre a gargalhada sonora que deu no segundo seguinte, McDonagh ainda oferece um filme humano que jamais desacredita na possibilidade de redenção de seus protagonistas, inclusive Dixon, aquele modelo incorrigível no qual jamais depositaríamos qualquer possibilidade de recomeço. Por tudo isso, a sede de vingança vem a ser secundária quando o fardo de continuar seguindo em frente é mais tolerável. + [Alex GonçalvesCine Resenhas]

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6º Lugar
Loveless, de Andrey Zvyagintsev 
54 pontos | 8 menções

A obra termina, ao mesmo tempo, de forma pessimista, elegante e cíclica, revisitando os galhos secos, decorrentes da frieza natural do ambiente no qual foram impostos, que vimos no início. Galhos que representam uma árvore genealógica de frieza tão característica dos estereótipos russos, mas que retratam uma história que poderia ter acontecido em qualquer lugar. É um filme que te esgota, que rouba sua força vital não através da tensão, mas do desamparo. Se Alyosha é encontrado ou não, no final, não importa. Ele é um sintoma, desde sempre um fantasma, um equívoco, e essa constatação vem no meio da projeção, quando nos ocorre de que o garoto nem ao menos chegou a existir. + [Cauê PetitoNervos]

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5º Lugar
Scary Mother, de Ana Urushadze
56 pontos | 9 menções

“Scary Mother” não é um filme convencional, nem uma abstração intragável. É sim uma convincente amálgama do real e o imaginário, comunicando sua narrativa ao espectador através de pequenos detalhes e sugestões, assim como sua protagonista encontra inspiração nos azulejos manchados de seu banheiro. Há algum momento ou outro redundante ou autoexplicativo, mas a experiência satisfaz por permitir que o público faça suas interpretações e por isso se coloque no lugar da própria Manana. Não é de se assustar que tenha sido escolhido como representante da Geórgia nos Oscar de 2018. + [Caio VechiatoCinematecando]

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4º Lugar
O Dia Depois, de Hong Sang-soo 
58 pontos | 9 menções

Falsas identidades que levam a falsas percepções de narrativa. A esposa confunde a amante, a novata fica confusa a respeito de quem é, de fato, seu chefe e o chefe é mais um daqueles machos hongsangsoonianos (essa expressão existe?) idiotas que se escondem sob uma falaciosa superioridade em face das mulheres ao seu redor. Neste sentido, não deixa de ser um binômio construção-desconstrução de personalidades que é operado pela estrutura narrativa não-linear. [Yuri DeliberalliDiscurso Cinematográfico]

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3º Lugar
Visages, Villages, de Agnès Varda e JR 
71 pontos | 10 menções

As discussões entre Varda e JR são hilárias e cheias de afeto e todo esse carinho é impresso na telona. Além das risadas garantidas, o documentário também se encaminha para um lado mais profundo, quando os entrevistados dessas pequenas cidades narram suas histórias. A cada local que passam, Varda e JR deixam um registro de sua visita e logo partem em busca de novas histórias e imagens. “Visages, Villages” é divertido porque cativa o espectador por conta do carisma de seus diretores, mas também desperta emoção ao registrar, de forma imagética, sentimentos de ilustres desconhecidos comovidos pelas proezas de dois grandes artistas. + [Vitor BúrigoCINEVITOR]

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2º Lugar
Custódia, de Xavier Legrand
79 pontos | 11 menções

O espectador é levado a fazer os cálculos do desfecho sem se perder. É como se a gente já conhecesse histórias semelhantes, ao mesmo tempo que queremos que nada de ruim aconteça. Eu espero que “Custódia” chegue facilmente no nosso circuitão comercial, porque o filme é tão bom quanto necessário no momento presente. + [Adécio Moreira Jr., Poses e Neuroses]

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1º Lugar
As Boas Maneiras, de Juliana Rojas e Marco Dutra
89 pontos | 14 menções

O trabalho de Marco Dutra e Juliana Rojas está em constante evolução. Dos primeiros curtas aos longas realizados solo ou em parceria, a dupla de cineastas construiu uma carreira sólida, explorando os limites do cinema de gênero, algo raro na produção do nosso país e encontrando uma assinatura que cria um elo entre todos os trabalhos que lançaram até agora. Nesse sentido, “As Boas Maneiras” é o filme mais bem resolvido dos dois, que namoram com um cinema mais popular, mas não abrem mão das próprias marcas e da ousadia.  + [Chico FiremanFilmes do Chico]

 

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Os 10 melhores filmes da 41ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo segundo Alex Gonçalves, editor do Cine Resenhas:

01. Três Anúncios Para Um Crime, de Martin McDonagh
02. Loveless, de Andrey Zvyagintsev
03. A Sombra da Árvore, de Haffsteinn Gunnar Sigurdsson
04. Scary Mother, de Ana Urushadze
05. Happy End, de Michael Haneke
06. Custódia, de Xavier Legrand
07. Bikini Moon, de Milcho Manchevski
08. A Trama, de Laurent Cantet
09. Não Me Ame, de Alexandros Avranas
10. As Boas Maneiras, de Juliana Rojas e Marco Dutra

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Os convidados:

Adécio Moreira Jr. | Poses e Neuroses

01. Pororoca, de Constantin Popescu
02. Custódia, de Xavier Legrand
03. Assim é a Vida, de Eric Toledano e Olivier Nakache
04. As Boas Maneiras, de Juliana Rojas e Marco Dutra
05. Três Anúncios Para um Crime, de Martin McDonagh
06. Feio e Cega, de Tom Lass
07. Lucky, de John Carroll Lynch
08. Ana, Meu Amor, de Cãlin Peter Netzer
09. Aos Teus Olhos, de Carolina Jabor
10. The Square, de Ruben Östland

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Adriano Garrett | Cine Festivais

01. 24 Frames, de Abbas Kiarostami
02. Arábia, de Affonso Uchôa e João Dumans
03. As Boas Maneiras, de Juliana Rojas e Marco Dutra
04. Custódia, de Xavier Legrand
05. O Dia Depois, de Hong Sang-soo
06. Aqueles Que Estão Bem, de Cyril Schäublin
07. Cocote, de Nelson Carlo de los Santos Arias
08. Napalm, de Claude Lanzmann
09. Três Quartos, de Ilian Metev
10. Scary Mother, de Ana Urushadze

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Caio Vechiato | Cinematecando

01. Visages, Villages, de Agnès Varda e JR
02. Sem Data, Sem Assinatura, de Vahid Jalilvand
03. Babylon Berlin, de Achim von Borries, Henk Handloegten e Tom Tykwer
04. Uma Questão Pessoal, de Pablo e Vittorio Taviani
05. O Outro Lado da Esperança, de Aki Kaurismäki
06. Scary Mother, de Ana Urushadze
07. Lucky, de John Carroll Lynch
08. Aos Teus Olhos, de Carolina Jabor
09. O Trabalho, de Gethin Aldous e Jairus Mcleary
10. A Oeste do Rio Jordão, de Amos Gitaï

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Cauê Petito | Nervos

01. Loveless, de Andrey Zvyagintsev
02. Scary Mother, de Ana Urushadze
03. Custódia, de Xavier Legrand
04. Três Anúncios Para Um Crime, de Martin McDonagh
05. As Boas Maneiras, de Juliana Rojas e Marco Dutra
06. Dhogs, de Andrés Goteira
07. Feio, de Juri Rechinsky
08. Bikini Moon, de Milcho Manchevski
09. Sexo, Piedade e Solidão, de Lars Montag
10. Happy End, de Michael Haneke

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Cecilia Barroso | Cenas de Cinema

01. Cocote, de Nelson Carlo de los Santos Arias
02. Arábia, de Affonso Uchôa e João Dumans
03. Pororoca, de Constantin Popescu
04. Pela Janela, de Caroline Leone
05. Antônio Um Dois Três, de Leonardo Mouramateus
06. O Amante de Um Dia, de Philippe Garrel
07. O Pacto de Adriana, de Lissette Orozco
08. As Boas Maneiras, de Juliana Rojas e Marco Dutra
09. A Trama, de Laurent Cantet
10. Grão, de Semih Kaplanoğlu

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Chico Fireman | Filmes do Chico

01. O Amante de Um Dia, de Philippe Garrel
02. As Boas Maneiras, de Juliana Rojas e Marco Dutra
03. Pela Janela, de Caroline Leone
04. Cocote, de Nelson Carlo de Los Santos Arias
05. Custódia, de Xavier Legrand
06. 24 Frames, de Abbas Kiarostami
07. Três Anúncios para um Crime, de Martin McDonagh
08. O Dia Depois, de Hong Sang-soo
09. A Telenovela Errante, de Raúl Ruiz e Valeria Sarmiento
10. O Outro Lado da Esperança, de Aki Kaurismäki

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Christian Barroso | Mostreiro

01. Visages, Villages, de Agnès Varda e JR
02. O Amante de Um Dia, de Philippe Garrel
03. Scary Mother, de Ana Urushadze
04. O Dia Depois, de Hong Sang-soo
05. Cocote, de Nelson Carlo de los Santos Arias
06. Loveless, de Andrey Zvyagintsev
07. A Telenovela Errante, de Raúl Ruiz e Valeria Sarmiento
08. As Boas Maneiras, de Juliana Rojas e Marco Dutra
09. Custódia, de Xavier Legrand
10. Ana, Meu Amor, de Cãlin Peter Netzer

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Davi Mello | sem tambor, nem trompete

01. 24 Frames, de Abbas Kiarostami
02. Visages, Villages, de Agnès Varda e JR
03. Tempo de Qualidade, de Daan Bakker
04. O Vale das Sombras, de Jonas Matzow Gulbrandsen
05. Cocote, de Nelson Carlo de Los Santos Arias
06. Irmãos do Inverno, de Hlynur Pálmason
07. Esplendor, de Naomi Kawase
08. The Square, de Ruben Östland
09. As Boas Maneiras, de Juliana Rojas e Marco Dutra
10. O Amante de Um Dia, de Philippe Garrel

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Hélio Flores | Mostreiro

01. Visages, Villages, de Agnès Varda e JR
02. O Dia Depois, de Hong Sang-soo
03. As Boas Maneiras, de Juliana Rojas e Marco Dutra
04. O Amante de Um Dia, de Philippe Garrel
05. Abaixo a Gravidade, de Edgard Navarro
06. Zama, de Lucrecia Martel
07. Essa é a Nossa Terra, de Lucas Belvaux
08. A Trama, de Laurent Cantet
09. Outrage Coda, de Takeshi Kitano
10. Lucky, de John Carroll Lynch

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Isabel Wittmann | Estante da Sala

01. Visages, Villages, de Agnès Varda e JR
02. As Boas Maneiras, de Juliana Rojas e Marco Dutra
03. A Sombra da Árvore, de Haffsteinn Gunnar Sigurdsson
04. Scary Mother, de Ana Urushadze
05. O Dia Depois, de Hong Sang-soo
06. Loveless, de Andrey Zvyagintsev
07. Praça Paris, de Lúcia Murat
08. Operações de Garantia da Lei e da Ordem, de Júlia Murat
09. The Square, de Ruben Östland
10. Mulheres Divinas, de Petra Biondina Volpe

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Marcelo Ferreira | CINESe7e

01. Pororoca, de Constantin Popescu
02. The Square, de Ruben Östland
03. Loveless, de Andrey Zvyagintsev
04. O Outro Lado da Esperança, de Aki Kaurismäki
05. 1945, de Ferenc Török
06. Além das Palavras, de Urszula Antoniak
07. Happy End, de Michael Haneke
08. Espinho, de Gabriel Tzafka
09. O Vale das Sombras, de Jonas Matzow Gulbrandsen
10. Não Me Ame, de Alexandros Avranas

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Paula C. Ferraz | Sinny Assessoria

01. Custódia, de Xavier Legrand
02. Arábia, de Affonso Uchôa e João Dumans
03. Pela Janela, de Caroline Leone
04. A Noiva do Deserto, de Cecilia Atán e Valeria Pivato
05. Visages, Villages, de Agnès Varda e JR
06. A Sombra da Árvore, de Haffsteinn Gunnar Sigurdsson
07. Temporada de Caça, de Natalia Garagiola
08. Loveless, de Andrey Zvyagintsev
09. O Vale das Sombras, de Jonas Matzow Gulbrandsen
10. Djam, de Tony Gatlif

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Paulo Costa | Cine&Cia

01. Custódia, de Xavier Legrand
02. Três Anúncios Para Um Crime, de Martin McDonagh
03. The Square, de Ruben Östland
04. Com Amor, Van Gogh, de Dorota Kobiela e Hugh Welchman
05. Berenice Procura, de Allan Fiterman
06. Daphine, de Peter Mackie Burns
07. Human Flow – Não Existe Lar se Não Há para Onde Ir, de Ai Weiwei
08. Severina, de Felipe Hirsch
09. Golias, de Dominik Locher
10. Crianças da Noite, de Andrea de Sica

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Pedro Strazza | O Nerd Contra-Ataca

01. Visages, Villages, de Agnès Varda e JR
02. Arábia, de Affonso Uchôa e João Dumans
03. As Boas Maneiras, de Juliana Rojas e Marco Dutra
04. O Dia Depois, de Hong Sang-soo
05. O Amante de Um Dia, de Philippe Garrel
06. A Trama, de Laurent Cantet
07. Zama, de Lucrecia Martel
08. Outrage Coda, de Takeshi Kitano
09. A Telenovela Errante, de Raúl Ruiz e Valeria Sarmiento
10. Lucky, de John Carroll Lynch

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Rafael Carvalho | Moviola Digital

01. As Boas Maneiras, de Juliana Rojas e Marco Dutra
02. Scary Mother, de Ana Urushadze
03. O Dia Depois, de Hong Sang-soo
04. Loveless, de Andrey Zvyagintsev
05. Visages, Villages, de Agnès Varda e JR
06. Zama, de Lucrecia Martel
07. Custódia, de Xavier Legrand
08. O Amante de Um Dia, de Philippe Garrel
09. A Telenovela Errante, de Raúl Ruiz e Valeria Sarmiento
10. Cocote, de Nelson Carlo de Los Santos Arias

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Tiago Paes de Lira | Tem Um Tigre no Cinema

01. Human Flow – Não Existe Lar se Não Há para Onde Ir, de Ai Weiwei
02. Visages, Villages, de Agnès Varda e JR
03. Custódia, de Xavier Legrand
04. Os Versos Esquecidos, de Alireza Khatami
05. Scary Mother, de Ana Urushadze
06. Doce País, de Warwick Thornton
07. Feio e Cega, de Tom Lass
08. Pororoca, de Constantin Popescu
09. Em Que Tempo Vivemos?, de Walter Salles, Jia Zhangke e outros
10. O Dia Depois, de Hong Sang-soo

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Vinícius Colares | Mostreiro

01. As Boas Maneiras, de Juliana Rojas e Marco Dutra
02. O Dia Depois, de Hong Sang-soo
03. Bikini Moon, de Milcho Manchevski
04. Três Anúncios Para Um Crime, de Martin McDonagh
05. Zama, de Lucrecia Martel
06. The Square, de Ruben Östland
07. Pororoca, de Constantin Popescu
08. Os Versos Esquecidos, de Alireza Khatami
09. Gabriel e a Montanha, de Fellipe Barbosa
10. Com Amor, Van Gogh, de Dorota Kobiela e Hugh Welchman

 

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Vitor BúrigoCINEVITOR

01. Custódia, de Xavier Legrand
02. Três Anúncios Para Um Crime, de Martin McDonagh
03. The Square, de Ruben Östland
04. Loveless, de Andrey Zvyagintsev
05. O Pacto de Adriana, de Lissette Orozco
06. As Boas Maneiras, de Juliana Rojas e Marco Dutra
07. Scary Mother, de Ana Urushadze
08. A Trama, de Laurent Cantet
09. Gabriel e a Montanha, de Fellipe Barbosa
10. A Sombra da Árvore, de Haffsteinn Gunnar Sigurdsson

 

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Yuri Deliberalli | Discurso Cinematográfico

01. O Amante de Um Dia, de Philippe Garrel
02. Zama, de Lucrecia Martel
03. O Dia Depois, de Hong Sang-soo
04. Caniba, de Lucien Castaing-Taylor e Verena Paravel
05. 9 Dedos, de F. J. Ossang
06. Arábia, de Affonso Uchôa e João Dumans
07. Essa é a Nossa Terra, de Lucas Belvaux
08. Ramiro, de Manuel Mozos
09. Os 7 Desertores. de Paul Vecchiali
10. Visages, Villages, de Agnès Varda e JR

Resenha Crítica | Mobile Homes (2017)

Mobile Homes, de Vladimir de Fontenay

.:: 41ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo ::.

Uma imagem que sempre provocou estranheza, quando não um efeito cômico, apresentada com certo costume na produção internacional falada em inglês é da residência completa em uma caminhão de transporte, quase uma casa de bonecas em tamanho gigante. Pois como bem antecipa o título em inglês deste segundo longa-metragem do francês Vladimir de Fontenay (o primeiro em direção solo), adentraremos aqui um pouco nesse universo dos lares manufaturados.

Ali (Imogen Poots) e Evan (Callum Turner) formam um casal sem nenhuma base que vive o dia presente tentando garantir que no seguinte tenha um teto para dormir ou um restaurante à beira de estrada para comer e fugir sem pagar. Nem o fato de existir um filho, Bone (Frank Oulton), força a busca por um mínimo de estabilidade. Porém, o choque de realidade bate quando um acidente acontece, com Ali precisando fazer as coisas por conta própria.

O envolvimento de Ali com Robert (Callum Keith Rennie), boa-praça que atua em uma empresa de casas modulares, vai evidenciando a metáfora óbvia do roteiro. Trata-se dessa dificuldade de enraizamento, de viajar quase à deriva sem estabelecer conexões emocionais com as pessoas e os locais que habitam.

Mesmo com talento estético perceptível, principalmente pela melancolia que extrai das paisagens mortas canadenses, Fontenay parece depositar em Imogen Poots o fardo de ser a única emissora de uma emoção verdadeiramente genuína. É o que assegura o interesse por “Mobile Homes”, pois a atriz inglesa é daquelas de uma beleza singular que comunica um universo de possibilidades em sua face, fazendo com que sejamos cúmplices de sua Ali mesmo em suas medidas mais inconsequentes.

Resenha Crítica | Não Devore Meu Coração! (2017)

Não Devore Meu Coração!, de Felipe Bragança

.:: 41ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo ::.

Frequentemente generosos com filmes brasileiros exibidos em festivais internacionais, a imprensa especializada não recepcionou bem “Não Devore Meu Coração!” quando foi exibido nas últimas edições dos festivais de Sundance e Berlim. Já em sua première em São Paulo na Mostra, não se ouviu aplausos no rolar dos créditos finais, uma formalidade comum até mesmo no mais desapontador dos filmes com a presença da equipe.

Isso talvez se deva porque há prós e contras na mesma medida nesta primeira experiência de Felipe Bragança na direção solo de um longa-metragem. Com o reacender das luzes, é difícil traçar de imediato uma reação mais favorável ou desfavorável ao longa, que deve a sua inspiração aos contos de Joca Reiners Terron.

Em tom de realismo fantástico, a história começa com Joca (Eduardo Macedo), um rapaz de 13 anos, sendo encantada por Basano (Adeli Benitez), menina indígena paraguaya que está prestes a completar 15 anos. O amor impossível entre dois pré-adolescentes divididos por suas culturas e conflitos históricos vai sedendo espaço para a continuidade de uma guerra sustentada pelos adultos.

No centro dela, há o irmão mais velho de Joca, Fernando (Cauã Reymond), um agroboy e também importante componente de uma gangue de motociclistas em uma fase de grandes dilemas, principalmente pelas pressões enfrentadas ao assumir uma linha de sucessão. Além da ausência de uma figura paterna, César (Leopoldo Pacheco), que o traumatiza, há uma mãe, Joana (Cláudia Assunção), que ele culpa por arrastá-lo para um ambiente em que não visualiza um futuro e a rivalidade entre gangues.

Cauã Reymond, um ator que tanto cresce pelo seu interesse em estabelecer parcerias com realizadores de cunho autoral, está muito bem em seu personagem, mas há algo em seu arco que estagna “Não Devore Meu Coração!”. Isso acontece porque há realmente uma inocência encantadora quando a narrativa é centrada no romance entre Joca e Basano, de quem teve o seu coração roubado de um modo quase literal. Porém, há um público que estará mais inclinado a simpatizar com Fernando justamente pelo teor menos fantasioso de seu drama, confirmando assim o caráter divisivo provavelmente não planejado por Felipe Bragança.

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+ Entrevista com Felipe Bragança
+ Entrevista com Cauã Reymond
+ Entrevista com Ney Matogrosso

Yonlu

Resenha Crítica | Yonlu (2017)

Yonlu, de Hique Montanari

.:: 41ª Mostra Internacional de Cinema em São Paulo ::.

Quem fizer questão de ver “Yonlu” no escuro, ainda assim já saberá no prólogo da narrativa sobre uma informação que o tornou conhecido pela maioria: o suicídio que cometeu com apenas 16 anos, em seu próprio apartamento em Porto Alegre. Assim, o que o diretor e roteirista Hique Montanari fará a partir disso é investigar todo um processo de depressão e as singularidades desse personagem, um músico promissor descoberto postumamente.

É o cenário de 2006, em que os computadores se transformaram em idem doméstico obrigatório, especialmente em família com adolescentes, e a comunicação à distância se dava mais em fóruns do que em redes sociais ou aplicativos de smartphones. Vinicius Gageiro Marques, como se chamava Yonlu, se apropriava desses recursos, fazendo amizades com usuários de outros países e buscando por plataformas para compartilhar as músicas que compôs.

Porém, se essa abertura para amizades virtuais evidenciava um garoto que poderia muito bem ter manejo para relacionamentos interpessoais no “plano real”, ela também demonstrava alguém fechado em si mesmo, com uma tendência enorme para atingir um nível irreversível de depressão. É o que paulatinamente vai acontecendo com o Yonlu vivido por Thalles Cabral, que encara o plano de interromper a própria existência como uma medida para a tristeza implacável proporcionada por um isolamento que o corrompeu e que encontra online uma contribuição assustadora para colocá-lo em prática.

Há boas intenções de Hique Montanari para a sua versão ficcional de Yonlu e o suicídio aqui não é debatido e encenado com essa poesia sedutora tão associada como dispositivo e largamente questionada com a vinda do seriado “Os Treze Porquês”. Ainda assim, é impossível relevar uma série de outras opções narrativas e visuais sustentadas pelo realizador.

Os primeiros dois atos de “Yonlu” mais parecem uma coletânea de clipes musicais e o que resta de dramaturgia não dá conta de entregar um personagem de contrastes, pouco correspondendo aos perfis de jovens deprimidos. Também pouco comunica o ritual repetido pela câmera nos espaços, como se com isso quisesse apontar sobre os riscos que há em não remover os filhos das privações perigosas de um quarto o dia todo de portas fechadas – os pais de Yonlu, mesmo obviamente isentos de qualquer culpa, são aqui exibidos como aqueles de um comercial de margarina.

Portanto, afora por nos (re)aproximarmos de um talento que tão cedo partiu, deixando como legado uma produção musical realmente consistente e que tanto se comunica pela abordagem das frustrações da tenra idade, “Yonlu” falha não somente como tributo, mas principalmente como uma obra cinematográfica que poderia exercer uma função social para uma geração mais delicada como nunca e que por vezes incorre a uma solução permanente para um problema temporário.