The Post, de Steven Spielberg
É fato de que o jornalismo segue exercendo um papel social importante ao explicitar para a sociedade muitos escândalos que são varridos para debaixo do tapete. Isso parte em nosso 2018 desde a campanha #TimesUp, que vem escancarando os inúmeros casos de abuso enfrentado por mulheres em Hollywood e em outros campos de atuação, até os registros amadores de vítimas das guerras que se sucedem no globo.
Ainda assim, a essência do exercício jornalístico que era praticado antes se modificou, moldando um novo modelo questionável especialmente com a dificuldade que existe nesta transição do impresso para o virtual. Na busca desesperada por cliques, recorre-se a tudo, da publicação de uma matéria sem a apuração adequada até a mera chamada para atrair o leitor-usuário.
Pois o dito jornalismo de verdade é revivido em “The Post: A Guerra Secreta”, filme do qual Steven Spielberg poderia muito bem ter orquestrado no início de sua carreira caso as suas inclinações artísticas estivessem voltadas mais ao cinema político do que a de entretenimento para movimentar as massas. Há quem inclusive aponte que o que ele faz aqui é um prequel espiritual de “Todos os Homens do Presidente”, o clássico moderno de Alan J. Pakula tido como um dos maiores exemplares cinematográficos sobre o jornalismo já produzido.
O que pavimenta “The Post: A Guerra Secreta” é o dilema assumido pelo repórter Ben Bradlee (Tom Hanks, mais uma vez esnobado no Oscar) e a sua editora do The Washington Post Kay Graham (Meryl Streep), que receberam em caráter anônimo a pista de arquivos que comprovariam as justificativas ficcionais para os Estados Unidos viabilizarem a Guerra do Vietnã, compondo o que fora batizado como os Papéis do Pentágono. The New York Times foi alvo de censura, restando o peso para o Washington Post de publicar a matéria completa sob o risco de falir o veículo com as pressões posteriores ou de passar a chance de fazer história deixando a concorrência assumir a bomba jornalística.
Conhecido por suas extravagâncias, Spielberg volta a fazer um drama sóbrio na linha de seu “Ponte dos Espiões“, confiando à história e aos seus notáveis atores a temperatura emocional para pulsar o seu trabalho. A direção que aqui exerce é, inclusive, uma de suas melhores, enchendo de tensão o simples caminhar na redação do Washington Post ou as ligações feitas em telefones públicos pelo repórter interpretado por Bob Odenkirk, o grande destaque do elenco.
“The Post: A Guerra Secreta” chega como um elemento estranho no Oscar 2018, pois só assegurou para si duas indicações: Melhor Filme e Melhor Atriz. Para a primeira categoria, é justificável a presença. Além de um grande filme, a sua história ecoa em um período delicado para a imprensa americana. Já em atriz, é mais um feito fácil para o recorde de Streep, sempre ótima, mas aqui como a ponta mais frágil dando vida à Kay Graham.
Em tempos de discursos feministas, Spielberg só exagera na licença poética, forçando a personagem como um modelo de liderança feminina. A maneira como ela é admirada ao descer pela escadaria da Suprema Corte chega a ser constrangedora. Mais adequado seria preparar à parte uma cinebiografia para Kay.

Eu gostei muito de “The Post: A Guerra Secreta”. Mesmo sendo um filme anticlimático, chama a atenção o fato de retratar uma história que nos relembra sobre a importância de uma imprensa livre e do desempenho de um jornalismo sério e comprometido com os preceitos éticos.
CurtirCurtir
Eu adorei, Kamila. Já havia apreciado a sobriedade de Steven Spielberg em “Ponte dos Espiões” e penso que aqui ele está em sua melhor forma.
CurtirCurtir